As raízes da payada remontam aos romances e quadras medievais e renascentistas, de temática popular, trazidos pelos povoadores espanhóis do território platino. O contato com o linguajar e com o dia-a-dia da vida campeira, porém, adaptou essas expressões à realidade da campanha.
O payador surge então como um artista errante que leva aos mais distantes rincões informação e entretenimento, por meio do relato de improviso dos acontecimentos da Capital (Buenos Aires ou Montevidéu). Acompanhando-se ao violão no embalar de uma milonga ou solito, sem instrumento, o payador era uma figura respeitadíssima – há relatos de que mesmo em campos de batalha o primeiro mate era dele, atropelando a hierarquia militar.
A mais célebre payada literária é o poema épico em sextilhas Martín Fierro (1872), escrito pelo argentino José Hernández. Ainda hoje a payada é uma expressão cultural forte na Argentina e no Uruguai, com nomes como o uruguaio Gustavo Villón e os argentinos José Larraude e Argentino Luna.
Payada
Ramagem, tronco, raiz...
Abriu-se uma cicatriz
de onde brotei na paisagem...
O tempo me fez mensagem
que os ventos pampas dirigem,
Dos anseios que me afligem
de transplantar horizontes,
Buscando o rumor das fontes
pra beber água na origem.
Sobre o lombo da distância,
de paragem em paragem,
Fui repontando a mensagem
de bárbara ressonância,
Fazendo pátria na infância
porque precisei fazê-la,
E a Liberdade, sinuela,
sempre foi a estrela guia
Que o meu olhar perseguia
como quem busca uma estrela.
Pensei chegar alcançá-la,
no estágio de índio rude,
Mas nunca na plenitude,
porque essa deusa baguala
Que aos andejos embuçala,
nunca ninguém alcançou,
Bisneto nem bisavô,
nos entreveros mais brutos,
Labareda de minutos
que o vento sempre apagou.
Primeiro era o campo aberto,
descampado, sem divisas...
Com fronteiras imprecisas,
mundo sem longe nem perto..
Eu era o índio liberto,
barbaresco e peleador
Rei de mim mesmo,
senhor da natureza selvagem,
A religião da coragem
e o sol de bronze na cor
Um dia veio o jesuíta
a este rincão do planeta
Vestindo a sotaina preta
na catequese bendita
Foi mais do que uma visita
à minha pampa morena
Bombeei por trás da melena,
olhos nos olhos o irmão,
E gravei no coração
a santa cruz de Lorena!
Mais tarde veio mais gente
às minhas terras campeiras...
A falange das bandeiras,
impiedosa e inclemente...
Me levantei de repente
e as tribos se levantaram...
As várzeas se ensangüentaram,
elas que eram verdejantes,
Mas eu venci os bandeirantes,
que nunca mais retornaram!
E depois vieram os lusos,
os negros, os castelhanos,
E nos pagos campejanos,
novas normas, novos usos...
As violências e os abusos
da Ibéria, Castela e Lácio
Que rasgaram o prefácio
e mataram as plegárias
E as ânsias comunitárias
dos irmãos de Santo Inácio.
Não pude deter a vaga
de Andonega e Barbacena...
Se a História não os condena,
a mancha nunca se apaga!
A opressão jamais indaga
na sua ambição mesquinha,
Era meu tudo o que tinha,
era meu tudo o que havia,
E eu morri porque dizia
que aquela terra era minha!
Mas o eterno não morre,
porque permaneço vivo...
No lampejo primitivo
de cada fato que ocorre
O meu sangue rubro corre
na velha raça gaudéria,
Corcoveando em cada artéria
pela miscigenação
Na bárbara transfusão
com os andarengos da Ibéria...
Fui sempre aquilo que sou,
sou sempre aquilo que fui,
Porque a vida não dilui
o que a mãe terra gerou...
Sou o brasedo que ficou
e aceso permaneceu,
Sou o gaúcho que cresceu
junto aos fortins de combate
E já estava tomando mate
quando a pátria amanheceu!!!
E assim, crescendo ao relento,
criado longe do pai,
Junto ao mar doce - o Uruguai -,
o rio do meu nascimento,
Soldado sem regimento
no quartel da imensidade...
Um dia me meu vontade,
deixei crescer toda a crina
E me amasiei com uma china
que chamei de Liberdade!
Por mais de trezentos anos
fui pastor e sentinela
Na linha verde e amarela,
peleando com castelhanos,
Gravando com "los hermanos"
a epopéia do fronteiro!
Poeta, cantor e guerreiro
da América que nascia
Na bendita teimosia
de continuar brasileiro!!!!
Com Bento em mil entreveros,
em barbarescos ensaios...
Depois contra os paraguaios,
em Humaitá e Toneleros
Andei em Monte Caseros,
Paisandu, Peribebuí
Passo da Pátria, Avaí...
longe do meu território...
E fui ordenança de Osório
nos campos de Tuiuti
Depois, em Noventa e três,
na gesta federalista,
A pátria a perder de vista,
andei peleando outra vez...
Sem soldo no fim do mês
porque pelear era lindo,
As espadas retinindo,
chapéu batido na copa,
Como carneador de tropa
nas forças de Gomercindo
Mais adiante, em Vinte e três,
em Vinte e quatro de novo...
É o destino do meu povo
que assim altivo se fez,
A marca da intrepidez
deste velho território!
Ante o bárbaro ostensório
dos lenços rubros e brancos
Acompanhei os arrancos
do velho Flores, e Honório...
Chimangos e maragatos,
farrapos, federalistas
Caminhadas e conquistas
que a história guarda em seus fatos
Os tauras intemeratos
de adaga e pistola à cinta...
Não há ninguém que desminta
nossa estirpe de raiz
Que se adonou da matriz
nas arrancadas de Trinta
Depois vesti a verde-oliva,
como sempre voluntário,
No "cuerpo" expedicionário,
formando uma comitiva
Da nossa indiada nativa
pra responder um libelo
E o pendão verde-amarelo,
no outro lado do mundo,
Cravei, bem firme e bem fundo,
no velho Monte Castelo!
Hoje, tempo de mudar,
meu coração continua
O mesmo tigre charrua
das andanças do passado.
Sempre de pingo ensilhado,
bombeando pampa e coxilha...
A pátria é minha família!
Não há Brasil sem Rio Grande
E nem tirano que mande
na alma de um Farroupilha!
Gostaria de ter o seu endereço para correspondência e assim poder enviar meu livro de pequisa sobre o pajador, que quebra alguns paradigmas, inclusive o de que a pajada tenha nascido na argentina como repetem muitos um depoimento equivocado de alguém mal informado.
Gostaria de sugerir a leitura do livro e a retificação do texto que comete o mesmo erro que vem se repetindo. Paulo de Freitas Mendonça
pajador_mendonca@hotmail.com
nativismo@nativismo.com.br